BNDES: a Caixa Preta que precisa ser aberta

Comentário do Taka: Segue abaixo um artigo escrito pelo Jorge sobre os financiamentos bilionários sob condições secretas do BNDES. O artigo foi escrito para um jornal paulista mas a redação do jornal negou-se em publicá-lo. A resposta que ele recebeu foi:
"É complicado de publicar por que o jornal está buscando anúncios institucionais do BNDES"
Essa é a imprensa livre que temos no Brasil. Como o Jorge andou espalhando o texto em listas de emails tomei a liberdade de divulgá-lo no meu blog. 

BNDES: a Caixa Preta que precisa ser aberta
 
Jorge Machado*

*O BNDES, como todos sabem, utiliza recursos para seus financiamentos oriundos de fundos públicos, tal como o FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador. Tendo sido criado para ser um banco de fomento ao desenvolvimento econômico e social, sua finalidade deveria também ser compatível com a origem dos recursos.

No entanto, chama a atenção que no governo Lula o BNDES tem sido usado continuamente para apoiar grandes grupos económicos, alguns destes que ajudaram na campanha do partido e com enorme poder de lobby. Chama ainda mais a atenção o fato de que o BNDES passou a fazer empréstimos a empresas altamente capitalizadas, como as telefônicas, e em condições de sigilo absoluto. O BNDES divulga apenas a política de algumas linhas de empréstimos. São para os tomadores menores. Para os bilionários empréstimos feito às teles, só se sabe o montante emprestado. Os números são impressionantes: a Telefônica recebeu R$ 2 bilhões, a Brasil Telecom R$ 2,1 bilhões, a Telemar R$ 2,4 bilhões, a Vivo R$ 1,5 bilhão e agora, para a a compra da BrT pela Oi foram outros R$ 1,5 bilhão.

O contribuinte atento deve estar se perguntando: qual é a taxa de juro cobrada nesses empréstimos? Qual é o período de carência? Qual é o prazo para pagamento? Enfim, quais são as condições gerais do negócio? E o que levaria uma empresa estrangeira como a Telefónica, que pode conseguir empréstimos facilmente a juros mais baixos na Europa, preferir usar o dinheiro do BNDES? Algum leitor, sabe qual é a política de empréstimo para tais empresas? Dúvido. O autor dessas letras tenta a quase um ano descobrir isso, mas essa instituição “pública” nega veementemente a divulgar quaisquer informações.

O BNDES alega não poder fornecer tais informações devido a proteção legal de sigilo bancário de seus clientes. Ou seja, o argumento sigilo bancário, que se aplica ao cliente e não ao banco, é utilizado para que o mesmo deixe de fornecer informações sobre as políticas e linhas de financiamento que estão sendo utilizadas. Tais informações deveriam ser públicas, pois não afetam diretamente o sigilo do cliente. Para os tomadores menores, não necesariamente amigos do governo e com poder de barganha muito menor do que esses grandes grupos, sabe-se as condições. Estão lá no site.

O princípio da publicidade é um princípio republicano elementar no trato com as coisa pública. Como se trata de recursos públicos, não se pode esconder esses dados. O art. 5º, inciso LX da Constituição, afirma que "a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social exigirem". A Carta Magna deixa claro que "todos os atos deverão ser públicos", ao mesmo tempo que restringe severamente quaisquer exceções.

Se o BNDES não faz nada ilegal ou imoral, qual é o problema em divulgar suas políticas de empréstimos? Afinal, qual é o atrativo se usar o dinheiro do BNDES? Será que é um negócio tão bom para o interese público o tanto quanto é para essas empresas? Por que os executivos do BNDES não tem coragem de divulgar esses dados?

A publicidade é fundamental em todas as funções e órgãos da república e o BNDES não pode ser uma ilha imune a leis e normas que regem a administração pública. O BNDES não é um banco privado e nem pode aspirar a funcionar como tal, simplesmente porque seus recursos são resultado do trabalho e suor de milhões de contribuintes.

O sigilo excessivo que marca essas operações não apenas lança dúvidas sobre a idoneidade de uma das instituições mais importantes do país, como ajuda a obscurecer ainda mais a nossa já combalida democracia. Esse é um exemplo que compromete ainda mais a credibilidade das instituições públicas, num país onde a falta de transparência cria terreno fértil
para a surgimento da corrupção.

*Professor de Gestão de Políticas Públicas
Universidade de São Paulo

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